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Manuel de Sousa Guimarães - (Serzedo/Guimarães - Brasil)
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Não possui títulos nobiliárquicos, mas o seu nome simples e plebeu vale e significa mais do que os mais complicados enredamentos da arte heráldica, porque significa inteligência - , a realeza moderna; porque significa trabalho, - a aristocracia coeva; porque significa probidade, - a mais autentica grandeza de todos os tempos; e porque na capital do Pará, onde é negociante matriculado e exerce funções de director da Praça do Comércio e membro da Junta Comercial, tem sabido honrar o país em que nasceu, e conquistar por igual a estima e a simpatia dos seus compatriotas e dos naturais da terra que escolheu para exercício da sua prestante actividade. Ao conceito invejável e unânime em que é tido, nos associamos hoje, concedendo-lhe, como de direito e de justiça, o lugar de honra do presente número. *** Nasceu Manuel de Sousa Guimarães aos 16 do mês de Abril de 1862, no lugar do Arco, freguesia de S. Miguel de Serzedo, concelho de Guimarães, e deveu o ser aos cônjuges João de Sousa Guimarães e D. Ana de Oliveira Guimarães, gente de modestos haveres mas de excelente reputação. Embarcou em 1873 para o Brasil, ambicioso de lançar-se na senda aventurosa do comércio. Chegado a Paraíba do Norte obteve colocação na casa de fazendas de Joaquim Pereira Vinagre, na qual trabalhou por espaço de três anos. Em seguida foi para Pernambuco, empregando-se na fábrica de chapéus pertencente á firma José Maia Irmão. Decorridos dois anos transferiu residência para a capital do Estado, empregando-se como caixeiro na importante casa do benemérito conde de Santo Elias. A reputação de honesta e laborioso, de inteligente e atilado que granjeará durante o tirocínio comercial, deu-lhe ensejo de, em 1884, fundar em Guajará e Atuá, na cidade de Muaná, uma casa retalhista, que dirigia durante dez anos, fazendo-a sucessivamente prosperar. Conhecidos os seus dotes de inteligência e actividade os poderes públicos confiaram-lhe em Muaná, vários cargos de responsabilidade, tais como o de juiz de direito, substituto, delegado em comissão e sindico das massas falidas, no desempenho dos quais se houve com a máxima isenção e competência. Entretanto movido pelo desejo de ampliar a esfera da sua acção laboriosa, deliberou retirar para a capital, tendo previamente como sócio o cidadão brasileiro Francisco Bezerra Viana. Fundou então na cidade de Belém, sob a firma Saraiva Guimarães Comp.ª uma casa de comissões, no Boulevard da República, a qual conseguiu pôr em relações comerciais com todos os mercados do interior. Essa casa gira actualmente sob a razão mercantil de Souza Guimarães. Pelo seu génio obsequiador, pela lealdade com que sempre procede, Manuel de Sousa Guimarães conquista de improviso as simpatias das pessoas com quem trata, por tal forma se impõe a extrema afiabilidade de que é dotado e a lisura do seu honrado carácter. Português de lei, liberal convicto, adepto dos princípios democráticos, vemo-lo sempre ao serviço das acusas mais generosas e dos ideais mais benemerentes. Lê-se-lhe na acentuação fisionómica a firmeza do carácter e a energia do temperamento, virtudes másculas que tem produzido iniludíveis provas. Em actos de patriotismo poderá quando muito ser igualado mas nunca excedido. Quando ao Pará aportou o cruzador Adamastor exercia o nosso estimado compatriota o cargo de presidente da directoria do Club Enterp; e nessa qualidade o seu espírito patriótico evidenciou-se, trabalhando eficazmente para o brilhantismo da soirée que o referido clube realizou em honra do comandante e oficialidade daquele barco de guerra português. Com igual solicitude e entusiasmo procedeu quando ali foi o cruzador D. Carlos, tomando parte activíssima nos trabalhos da comissão angariadora de donativos para custeio das festas que, por tal motivo, realizou a colónia portuguesa do Pará. O seu nime figura também entre os subscritores para a compra da canhoneira Pátria e do cruzador Adamastor. Como filantropo tem o nome inscrito nos anais das instituições de piedade, designadamente da Sociedade Portuguesa Beneficente, de que foi proclamado benfeitor. Vamos citar, a propósito, um facto demonstrativo do alto relevo do seu espírito patriótico e do seu esclarecido e indeclinável amor de justiça e rectidão. Estabelecida que foi, no Brasil, a chamada lei da grande naturalização, muito dos nossos compatriotas, especialmente os que possuíam vapores destinados a navegação de cabotagem, viram-se, por assim dizer, coagidos a aceitar a naturalização. Aceitaram-na, mas não a solicitaram. Todavia, várias agremiações portuguesas entenderam por conveniente estabelecer desde então nos seus estatutos determinadas cláusulas, vedando aos sócios naquelas condições o direito de votarem ou serem votados para as respectivas directorias. Posto que baseada em rebates de patriotismo, essa medida, por estreita e violenta, produziu rijos atritos e levantou justificada celeuma, bastando dizer que, por efeito dela os mais beneméritos impulsionadores e até sustentáculos dessas sociedades foram postos de parte e obliterados os seus serviços. Isto despertou o protesto de muitos sócios, entrando nesse número o nosso biografado. Por isso, e porque possui a coragem das suas opiniões batalhou com inusitado ardor, para que semelhante exclusivismo fosse banido. Em várias assembleias gerais do Grémio Literário Português, de cuja directoria fazia parte, da Sociedade Portuguesa Beneficente e do Hospital Português de Pernambuco, o nosso compatriota se esforçou por conquistar a efectividade prática desse desejo. Se o não conseguiu, deixou ao menos na memória a grandeza do seu esforço e a sinceridade e a pureza das suas intenções, por vezes tão sensatas e conscienciosas, que os tíbios, não tendo ânimo para aplaudi-las francamente, se não esquivavam contudo a confessar em voz baixa que eram justas e criteriosas Que, de resto, Manuel de Sousa Guimarães foi sempre cioso das prorrogativas nacionais, interessando-se vivamente pelo prestígio da colónia a que pertence. Foi a instancias suas e de alguns seus colegas que o governo português nomeou para o Pará um cônsul de carreira, zeloso e íntegro, como é o actual cônsul português no Pará , snr. Adelino Ferreira. Foi incontestavelmente um bom serviço, mas não é felizmente o único. Agora mesmo está o nosso ilustre compatriota tornando viável um cometimento da maior utilidade. Referimo-nos à próxima inauguração das viagens do magnífico vapor Rio Guamá, que Manuel de Sousa Guimarães mandou construir em Inglaterra e que destina ao serviço de carga e passageiros naquele rio de tão prometedor futuro para os interesses do comércio e da agricultura indígenas. Atenta a deficiência e as péssimas condições náuticas em que se encontrava a navegação no rio Guamá, a iniciativa de Manuel de Sousa Guimarães representa um alto serviço meritório, muito para agradecer e louvar. O nosso prezado compatriota tenciona pessoalmente assistir á inauguração, e nesse dia não lhe faltarão por certo expressivas felicitações. O novo barco, além de solidamente construído e de importante tonelagem, acha-se dotado com todas as condições requeridas para a navegação a que se destina. Mas superiores a todos estes atestados de prestimosidade, estão os primores do seu apreciabilíssimo carácter, a cativante bizarria do seu trato, a generosidade com que está sempre disposto a socorrer os desvalidos e a prestar concurso a todos os seus amigos. O nosso estimável compatriota, que actualmente reside na sua bela vivenda de Serzedo, consorciou-se em 1889 com a sua sobrinha D. Clementina Ferreira da Silva Guimarães, que lhe tem iluminado a existência com os seus encantos da amizade e os adoráveis perfumes da virtude e da dedicação conjugal. Deste matrimónio existem duas interessantes filhinhas, que são o justo enlevo e o justificado desvanecimento dos simpáticos consortes. Deste conjunto de felicidade resulta o respirar-se no seu lar uma atmosfera de encantadora suavidade, sobre dourada pela atraente e incomparável hospitalidade dos donos da casa. in Portugueses no Brasil Álbum Photo Biographico 9º Numero Ano 1º Transcrição e Actualização de Texto por Rolando Guimarães