Era um sonho denso, uma ambição profunda que cavava as almas, desde a infância à velhice.
O Oiro do Brasil fazia parte da tradição e tinha o prestígio duma lenda entre os espíritos rudes e simples.
Viam-no reflorir nas igrejas, nos palacetes, nas escolas, nas pontes e nas estradas novas que os homens enriquecidos na outra margem do atlântico mandavam executar.
Viam-no erguer-se, refulgente, ofuscante, em moedas do tamanho do sol ao fundir-se na linha do horizonte, precisamente para os lados onde devia ficar o país maravilhoso.
E nenhuma esperança de grande prosperidade havia que não fosse cimentada com esse oiro que lá longe brotava, ininterruptamente.
Registavam-se até desalentos, pouca perseverança no trabalho da terra nativa, porque ninguém tinha fé, ninguém, em que esta viesse a compensar desgostos e canseiras.
Palavra mágica, o Brasil exercia ali um sortilégio e só a sua evocação era motivo de visões esplendorosas, de opulências deslumbrantes e vidas liberadas.
Sujeitos ao ganha-pão diário, sofrendo existência mesquinha, os lugarejos sonhavam redimir-se, desde as veigas em flor ao dorso das serranias, pelo oiro conquistado no país distante.
Aquela ideia residia dentro do peito de cada homem e era orgulho implacável até nos sentimentos dos mais agarrados ao terrunho.
Vinha já dos bisavós, de mais longe ainda; coisa que se herdava e legava, arrastando-se pela vida fora como um peso inquietante.
Todas as gerações nasciam já com aquela aspiração, que se fazia incómoda quando não se realizava.
Acocorava-se no canto da alma, como talismã, usável em momentos de desafio à sorte, ou como um bordão, para os instantes de soluções desesperadas»
(Ferreira de Castro, Emigrantes)